Quousque tandem abutere
Catilina patientia nostra?
2º copítulo
oh sinhores que gritos e louvores serão precisos para dizer que interpretações há muitas e que entre uma mulher o seu escritório ninguém põe a colher que não falava disso e não era essa a intenção, que me levam já com o rolo da massa e se for preciso com o fogão. que não tenho de me explicar nem dar o nariz a torcer, que quem diz é quem sabe e que quem fez é quem é. que o equilíbrio do mostrasconde é o que faz isto girar, que sei disso bem e o resto é conversa. falava da pretensão macaca de quem abre a matraca para falar mal de quem não fala, de quem se apetrecha do pedregulho para magoar e fazer barulho. foi inspiração não foi tempestade em golpe de água. não falava dos pézinhos de lã, do tule e da hortelã, do sussuro do ditado inaudito, da reza do aflito e da buzina sem ar, do que não se pode cantar e daquilo que se parte se é desenhado, entornado no papel rasgado. que a palavra é de outro e o silêncio é que parte.
não, ele não está muito bem«imagino um espelho digital que nos permita experimentar diferentes combinações de roupa e nos aconselhe: "você hoje não está muito bem"»
Bill Gates, in Expresso de 17Fev2007
excrever
Senta-te diante da folha de papel e escreve. Escrever o quê? Não perguntes. Os crentes têm as suas horas de orar, mesmo não estando inclinados para isso. Concentram-se, fazem um esforço de contensão beata e lá conseguem. Esperam a graça e às vezes ela vem. Escrever é orar sem um deus para a oração. Porque o poder da divindade não passa apenas pela crença e é aí apenas uma modalidade de a fazer existir. Ela existe para os que não crêem, como expressão do sagrado sem divindade que a preencha. Como é que outros escrevem em agnosticismo da sensibilidade? Decerto eles o fazem sendo crentes como os crentes pelo acto extremo de o manifestarem. Eles captarão assim o poder da transfiguração e do incognoscível na execução fria do acto em que isso deveria ser. Escreve e não perguntes. Escreve para te doeres disso, de não saberes. E já houve resposta bastante.
Vergílio Ferreira, in "Pensar"
Escrever. Porque escrevo? Escrevo para criar um espaço habitável da minha necessidade, do que me oprime, do que é difícil e excessivo. Escrevo porque o encantamento e a maravilha são verdade e a sua sedução é mais forte do que eu. Escrevo porque o erro, a degradação e a injustiça não devem ter razão. Escrevo para tornar possível a realidade, os lugares, tempos que esperam que a minha escrita os desperte do seu modo confuso de serem. E para evocar e fixar o percurso que realizei, as terras, gentes e tudo o que vivi e que só na escrita eu posso reconhecer, por nela recuperarem a sua essencialidade, a sua verdade emotiva, que é a primeira e a última que nos liga ao mundo. Escrevo para tornar visível o mistério das coisas. Escrevo para ser. Escrevo sem razão.
Vergílio Ferreira, in 'Pensar'
Não ter já nada para dizer e continuar a escrever é um crime, porque não tem o direito de continuar a escrever se não tem nada para dizer.
José Saramago
Escrever é uma maneira de falar sem ser interrompido
Jules Renard
despoleta-se já aqui o verbo pelos ditos acima e pelos aqui ditos e dá-se voz à vontade de resmungar sem cerimónia que vamolá escrever, partir o bico do lápes e a cachimónia. que não há direito de proibir à gente seja o que for e já bem basta o auto imposto de sê-lo. faz-se lixo e abatem-se árvores e pelo meio correm rios de treva e treta. mas também corre o atleta de fundo, nas mesmas pistas a deixar diferentes rastos. agora não se manda é calar ninguém, nem o paulo coelho. ou o 25 de fez-se para quê. a essa musa calada eu pontapeio e dou estalada, que aqui e além as vozes devem ouvir-se e não se cale ninguém. para o melhor e pior, todos comem com as mãos com que escrevem e escrever é saír, pensar, cirandar, cindir. até que a morte nos separe da seara alheia. alarga o tempo e o passamento, abranda o lento e salva o pé de salsa do esquecimento. que escrever é esta coisa de respirar. para quem pode, deve. para quem tem a sorte de saber, de prever e adivinhar que não deixe definhar a letra com falta de veia e coragem, que abraçe a corrida contratempo e dele se desembarace. que não se dê o rito por não dito, que floresça o benigno e o maldito para se aprender a ver, escrever e contar com quantos dentes se tem. é fixar e fugir, contaminar e infringir. proibir pode ser tentação, escorraçar o meio-irmão, o coxo bastardo mas limitar é diminuir, atentado, roubo silenciado. vergílio é herói, saramago um coitadinho. renard disse-a toda para mim. que falo da minha pessoa, sim. do que sei melhor e nada sei, do que disse e arquivei. é sem ser interrompido, a plenitude do escrevido. o falar metralhado na folha branda linda e lisa, fazer dela a camisa alva e alta de entre campos, para florir e florear, para riscar e rasgar. para a vingança e a promessa, o que devolve e arremessa. a liberdade na ponta da caneta, em frente ao espelho a careta. o transe lácteo das linhas tortas do caderno hodierno, há herança sempre, nem que seja prato rachado ou um pano manchado. tem de se ficar para a história, para lhe ver o final, para lhe fazer sinal. não se prive ninguém do seu papel se sente vontade de dar a parte. que arrogância reaccionária de quem tem medo de que o tapete lhe fuja dos pés. ter medo é bom mas atiçar o cão é perder a mão, dizer adeus ao que podia e devia. é negligência e falta de fé, romaria sem se ir a pé. confesso que o faço para que ninguém me cale, porque me arrogo no direito de soltar o que vai no peito e não o faço em suficiência. que adio o baralho das cartas e das trocas, que o meu fundo vai longo e escruo mas ai de quem me amordaçar, morderei até sangrar. e isto vale para todos os ditadores meia tigela vazia. espernearei e cuspirei fogo e farpas. cada um escolhe o seu mas ninguém manda no meu. que nada se perca, que ninguém se venda à ideia cega de que não é que chegue, que se peça mais e que se pense e se aprenda a viver. que se aprenda.
you talking to me?
não sou pessimista desenfreada mas para muita coisa, tristemente, já levo um pé atrás e uma mão à frente não vá o diabo torcê-las. preparo-me assim semi-inconscientemente para o pior que possa vir de uma situação. estratégia pobrezinha de espírito mas por vezes preferível à golpada. o que me pode privar de certas alegrias mas que faz valer muito mais uma surpresa pela positiva. enfim, não fosse a auto-defesa andava aí aos caídos. e assim sempre me sobram histórias para contar.
a última foi à saída do cinema, película de casa cheia, demora na hora do escoamento.
na última parte do filme é dada ênfase a um objecto, uma arma.
enquanto seguia no escuro, no meio da carneirada oiço um senhor dizer a quem o acompanhava: vês, é igual à que te dei. bem boa. já não se fazem dessas. estima-a bem. é igualzinha, hã?
nisto, avessa à violência que sou e de forma protestante, escapou-me um irónico, hã? já viste?
e ele, que não deve ter ouvido ou percebido que o piropo lhe era dirigido, continua a gabarolice:
deves andar sempre com ela. uma pilha de bolso faz sempre falta.
fui desdita e bem feliz fiquei. com todos muito sérios pela porta fora a olhar de lado para mim que gargalhava que nem doida, rebolando-me rendida na minha estupidez.
eu por aí abaixo assinada
a rainha da bananalidade.
não saber ler mais na diagonal, as quinze páginas e é o final, a pilha amiga a rima que o diga mais o enxoval. que o que importa quem o sabe, nem aqui nem noutro lade e os outros raizosparta são tão brutos que até farta. frutos da geração, no princípio e na coclusão. falta o tempo das horas extraordinárias, de todas e das várias do correr por uma bandeira desfraldada que mais vale achada que comprada e bandeiras leva-as o vento. não ver ninguém a mexer é de se ficar parado, o quererdanças mas ficarassustado com a fronha matinal, a notícia no jornal e a brilhantina que confundimos com o ismo que nos abala e é isso mismo o terrorismo de fazer muito do pouco nada daquilo que sabemos fazer bem. amola e amassa a gente ameaça não ser diferente e amedronta por isso assim, ter medo de me perder a mim no meio do caroço, se procurar a cabeça perco o dorso e se me calo é este abalo debalde baloiço em que se falo já não oiço e depois não acredito em mais nada nem na santa imaculada conceição da vida airada. desculpe-se este espirro e tudo o resto com que me afige e tenho para dar e vender, no fundo toda piscicanálise do subfundo do mar. atchim assim de fininho, não vá o gordo tornar-se cheiinho e eu ficar de corrida a pastar, quebrar o feitiço trocar o juízo pelo postiço e de tanto suspender não poder mais pousar. que é preciso é variar, fazer a revolta dos passos em volta e voltar a girar. a quere-se mais e também mais tempo quere-se o consolo a sopa o alento. quer-se a preguiça e manso o vento, o ser capaz o anda rapaz que o dia raiou e o que lá foi já vai, constrói e distrai. o samba mossa nova espacial toda teias apertadas em batechapas corropios por dentros nos encontrões com fadas e gotas em hortas de imansidões de jaguares e kafkas lentos metros nulos oblíquos e pulos queridos e rudes sonolências de telas urdidas vendidas a uma xerazade zonza. exercícios de esticar os ossos, colho os meus e deleito-me com os vossos. que pimpinela há só uma, toda esta e mais alguma.
art & texture
sei desde há muito que as calças de ganga e afins de bainha muito subida a mostrar o tornozelo à vela por cima de uns sapatos da cuja vem dos meninos bem da nobreza arruinada fadista meio puída que em escadinha von trapp faziam descer a roupa entre si e a aguentavam até onde podiam. eram coisas boas e aguentavam gerações. um dia um tôlo parolo mais observador reparou e achou que era opção e começou tudo a fazer igual. as bainhas, não o resto.
descobri, e aqui a novidade, o outro lado da moeda. é que as calças pingonas gotejantes pernas abaixo do arruaceiro marginal surfista original têm o mesmo motivo.
ain't life sweet? obrigada banksy pelo acrescento. e assim o mundo gira.